Despedidas
Sob um tecto laminado de cortiça, o cheiro intenso dos pólens vai-se atirando às paredes da pequena sala rectangular, escamoteando a ausência de cheiro dos parturientes.
Ao centro, um rectângulo mais pequeno, albergando a última morada do ente querido que ontem decidiu despedir-se em surdina.
Composta por zumzuns, e alguns risos abafados pelo carácter solene do momento, a atmosfera vai-se tornando cada vez mais pesada, como se o ar invisível absorvesse toda a luz e toda a alegria circundantes.
O silêncio característico destas ocasiões fora substituído pelos cumprimentos entusiasmados dos parentes, que contrariando o sentido etimológico da palavra, há muito se habituaram a um grande distanciamento.
Por entre primos abraçados e o ressuscitar de algumas senhoras de idade há muito esquecidas por força dos seus hábitos próprios de vampiros, não o de morder pescoços, mas o de limitarem as suas saídas a horas tardias já banhadas pelo escuro da noite.
Já no fim da ocupação religiosa, o choro toma conta dos presentes, que revivendo memórias comuns, olham impotentes para a eterna quietude do corpo que ainda há pouco era pessoa.
Derrotados pela maior certeza de quem vive, fazem-se promessas de encontros, confessam-se desejos viciados pelo momento, e as vidas continuam, quase sem alterações, ou não fosse o elo ter desaparecido, ali, para sempre.
Raspam-se as terras com o metalizado dos sachos, e enchem-se buracos, atrás de buracos, ao silêncio das palavras de quem, segundo o prior que dirigiu a eucaristia, estava agora a fazer contas com o SENHOR.
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