sexta-feira, julho 26, 2013

Diminutivinho

Frederico usava ocasionalmente o sufixo inho para carinhosamente dirigir-se ao seu avô.
Não raras vezes empregava-o aqui e ali para complementar outras palavras, longe de pensar que tal uso ou costume (convicção de obrigatoriedade?) podia abrir-lhe um porta para a alma e, há quem diga, para o seu âmago emocional evidenciando o que só o coração alberga longe do olho nu.

...Naquela tarde, os imprevistos expuseram as imperfeições e os defeitos de Frederico. Desde o milímetro de rúcula firmemente agarrado a um pré-molar, até à condução aparentemente frenética, mas só ansiosa.
O rapaz queria que tudo corresse bem, porque ele estava bem e isso notava-se. Ela estava sentada ao seu lado e assistia a tudo.
Eis que um dos diminutivos ousou sair-lhe tão naturalmente da boca e, depois de um silêncio quase inexistente, ouviu-a deixar escorregar em jeito de prognose: "sabes que quem usa diminutivos (diz-se que) tem carências afectivas".
Não bastavam as íris oceânicas que o fulminavam e que o punham fora de si, a rajada concertada de palavras abateu-se sobre ele e bloqueou-lhe a reacção.
Gracejou, perdido no labirinto das respostas possíveis, debatendo-se nas areias movediças da incerteza que subitamente o engoliam.

Nada lhe saía enquanto analisava a afirmação procurando indícios da sua veracidade...nada.

Sou uma pessoa sensível - foi a única coisa que conseguiu dizer-lhe.

O incidente não foi esquecido... Mas lentamente, com o crepúsculo à vista, a tarde começou a desembrulhar-se como um abraço de pétalas que na presença do sol se desfaz e as estende para fora, ledas, exibindo as suas cores exóticas, o seu interior...

O tempo contado personificado no adulto que retira bruscamente o rebuçado da boca da criança, anunciou o fim do baile de copos, de olhares, de conhecimento e mensuração. O sorriso instalara-se no rosto de Frederico sem que se apercebesse, tão atordoado que estava. Procurava manter o "rebuçado na boca" um pouco mais, um pouco mais.

Flashforward...................................

....Entrou no seu carro num "estalar de dedos" porque o "diabo esfregava de forma propositadamente lenta o olho". E ela sabia-o.
Ele ainda sorri...

"I am Jack's cold sweat."

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